Por *Elvécio
Andrade
As quase 900 páginas do relatório final da
Polícia Federal sobre os eventos que culminaram no fim do governo Jair
Bolsonaro (PL) revelam informações cruciais sobre a atuação das Forças Armadas
no período de tensão política. O documento destaca que, apesar de pressões para
embarcarem em uma tentativa de golpe de Estado, altos oficiais, sobretudo dois
dos três comandantes das Forças Armadas, não aderiram à ideia e, com isso,
desencorajaram o então presidente a levar adiante seu plano golpista.
Essa resistência institucional foi essencial
para evitar uma ruptura democrática. Ao recusar apoio a uma iniciativa de
tamanha gravidade, os comandantes preservaram, ao menos parcialmente, o
compromisso das Forças Armadas com a ordem constitucional. No entanto, o relatório
aponta para um ponto controverso e que pode gerar implicações jurídicas e
morais: a omissão dos comandantes diante da proposta de golpe.
Segundo o entendimento de especialistas e a
análise da legislação brasileira, ao serem abordados pelo então presidente com
a ideia de um golpe de Estado, os comandantes das Forças Armadas tinham a
obrigação legal e moral de agir para proteger a democracia. Isso incluía,
potencialmente, a prisão do presidente por flagrante de conspiração contra a
ordem democrática, um ato que está previsto no Código Penal e nas normas de
defesa da Constituição. Ao não fazê-lo, esses oficiais podem ter cometido crime
de prevaricação, definido como o atraso ou omissão dolosa no cumprimento de um
dever funcional.
A gravidade da omissão
O papel das Forças Armadas em uma democracia
deve ser estritamente técnico e subordinado ao poder civil. Qualquer sinal de
envolvimento ou omissão em práticas antidemocráticas representa um desvio grave
de sua função constitucional. No caso em questão, ao não denunciar ou tomar
medidas contra o presidente, os comandantes abriram margem para questionamentos
sobre sua conduta e lealdade ao Estado de Direito.
Embora não tenham embarcado no golpe, sua
passividade diante da proposta poderia ter contribuído para prolongar o
ambiente de incerteza e instabilidade política no país. Além disso, essa
postura alimenta o debate sobre os limites da responsabilidade de agentes
públicos em cargos estratégicos, especialmente em momentos de crise
institucional.
A identificação de um possível crime de
prevaricação por parte dos comandantes exige que o Ministério Público e demais
órgãos competentes investiguem e, se necessário, apresentem denúncias. A
impunidade nesse caso poderia enviar um sinal perigoso: de que mesmo ações
graves como a conspiração contra a democracia podem ser tratadas com leniência.
Reflexões para o futuro
Por outro lado, as conclusões do relatório
reforçam a importância de mecanismos de controle sobre as Forças Armadas e a
necessidade de delimitar claramente seus papéis. A Constituição de 1988
estabelece que as Forças Armadas são instituições permanentes, regidas pela
hierarquia e disciplina, mas sempre subordinadas ao poder civil. Qualquer
transgressão dessa norma deve ser punida exemplarmente.
O episódio serve como um alerta para o Brasil e
para qualquer país que valorize a democracia. A proximidade das Forças Armadas
com o poder político é sempre uma questão sensível, que exige vigilância
constante por parte da sociedade civil, da imprensa e das instituições. Para
evitar crises futuras, é crucial reforçar a formação democrática das lideranças
militares e garantir que quaisquer desvios sejam apurados e responsabilizados
com rigor.
A recusa dos comandantes em participar do golpe
foi fundamental para impedir uma ruptura. No entanto, a omissão diante de uma
proposta golpista não pode ser ignorada. Este caso ilustra a necessidade de
fortalecer a cultura democrática, assegurando que todos os agentes públicos,
independentemente de sua posição, sejam responsabilizados por suas ações, ou
pela falta delas.
*Elvécio
Andrade
é radialista, jornalista, escritor e advogado especialista em direitos
Constitucional e Administrativo
Siga-nos no
Instagram: @colatinanews2019, no
Facebook: @sitecolatinanews, no
TikTok: @colatinanews e se inscreva no nosso
canal: @colatinanews4085!
Nenhum comentário:
Postar um comentário