Ademar Paiva
Eu
não gosto de você, Papai Noel!
Também
não gosto desse seu papel
de
vender ilusões à burguesia.
Se
os garotos humildes da cidade
soubessem
do seu ódio à humildade,
jogavam
pedra nessa fantasia.
Você talvez nem se recorde mais.
Cresci depressa, me tornei rapaz,
sem esquecer, no entanto, o que
passou.
Fiz-lhe um bilhete, pedindo um
presente
e a noite inteira eu esperei,
contente.
Chegou o sol e você não chegou.
Dias
depois, meu pobre pai, cansado,
trouxe
um trenzinho feio, empoeirado,
que
me entregou com certa excitação.
Fechou
os olhos e balbuciou:
“É
pra você, Papai Noel mandou”.
E
se esquivou, contendo a emoção.
Alegre e inocente nesse caso,
eu pensei que meu bilhete com atraso,
chegara às suas mãos, no fim do mês.
Limpei o trem, dei corda,
ele partiu dando muitas voltas,
meu pai me sorriu e me abraçou pela
última vez.
O
resto eu só pude compreender quando cresci
e
comecei a ver todas as coisas com realidade.
Meu
pai chegou um dia e disse, a seco:
“Onde
é que está aquele seu brinquedo?
Eu
vou trocar por outro, na cidade”.
Dei-lhe o trenzinho, quase a soluçar
e como quem não quer abandonar
um mimo que nos deu, quem nos quer
bem,
disse medroso: “O senhor vai trocar
ele?
Eu não quero outro brinquedo, eu
quero aquele.
E por favor, não vá levar meu trem”.
Meu
pai calou-se e pelo rosto veio
descendo
um pranto que, eu ainda creio,
tanto
e tão santo, só Jesus chorou!
Bateu
a porta com muito ruído,
mamãe
gritou ele não deu ouvidos,
saiu
correndo e nunca mais voltou.
Você, Papai Noel, me transformou num
homem
que a infância arruinou, sem pai e sem
brinquedos.
Afinal, dos seus presentes, não há um
que sobre
para a riqueza do menino pobre
que sonha o ano inteiro com o Natal.
Meu
pobre pai doente, mal vestido,
para
não me ver assim desiludido,
comprou
por qualquer preço uma ilusão,
e
num gesto nobre, humano e decisivo,
foi
longe pra trazer-me um lenitivo,
roubando
o trem do filho do patrão.
Pensei que viajara,
no entanto depois de grande,
minha mãe, em prantos,
contou-me que fôra preso
e como réu, ninguém a absolvê-lo se
atrevia.
Foi definhando, até que Deus, um dia,
entrou na cela e o libertou pro céu.
Feliz Natal a todos!!!!!
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